Imperialismo

A OTAN – A maior ameaça à Europa

25/07/2016

Nas suas últimas decisões, a OTAN coloca à beira do conflito nuclear uma série de países do leste europeu com cerca de uma centena de milhões de habitantes. A cabeça da OTAN, os EUA, estará longe do local do conflito, uma vez mais na História, e despreza a vida de tantas pessoas inocentes!

Por António Abreu

Na cimeira de 8 e 9 de Julho, em Varsóvia, e nos maiores exercícios militares jamais realizados na Europa, que começaram dias antes, várias foram as decisões graves, como foi referido por muitos comentadores como Eric Draitser (1).

Particularmente grave é a expansão da presença militar da OTAN, com bases permanentes e sistemas de escudos antimísseis (2) ao longo das fronteiras da Rússia, particularmente na Polônia e nos países bálticos, Estônia, Letônia e Lituânia. A partir de 1917, com fundamento numa suposta ameaça russa que já se teria verificado quando este país aceitou a integração em território da Federação Russa, da Crimeia, decidida esmagadoramente pela sua população em referendo, ou quando apoiou as populações russas do Donbass, fustigadas, como na Crimeia, pelas hordas fascistas que os EUA desencadearam ao apoiar o golpe na Ucrânia.

Os sistemas antimísseis incluem a presença de soldados norte-americanos e, “para não vexar” a população desses países, a OTAN até “se permite” haver uma rotação dos batalhões blindados e ser ela (e não os EUA) a terem o seu comando – o que é uma hipocrisia, pois o comandante-geral da OTAN é sempre um norte-americano.

Para quebrar qualquer interpretação positiva do retomar das reuniões do Conselho OTAN/Rússia, um destroyer norte-americano equipado com um sistema para teleguiar mísseis, o USS Ross, equipado com o avançado sistema de defesa de mísseis Aegis, entrou para o Mar Negro neste sábado e dirigiu-se para o porto da cidade ucraniana de Odessa, para se juntar aos exercícios marítimos internacionais Sea Breeze 2016.

A OTAN conhece bem a posição da Rússia quanto a este ato provocatório. “Vamos destruir essas armas. A Rússia nunca mais voltará a lutar no seu próprio território”, afirmou no passado dia 13 ao Der Spiegel, Sergei Karaganov, do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo.

Putin não demorou a responder à provocação, dando indicações para que se procedesse a uma inspeção do estado de preparação para combate das forças russas e dos seus arsenais. O novo secretário-geral da OTAN, M. Stoltenberg reagiu dizendo que não estão a provocar o regresso à “guerra fria” e que nenhum país membro da OTAN se encontrava sob ameaça.

Porém, a decisão foi tomada e a instalação na Polônia e na Romênia, desde já, de sistemas antimísseis não ficou sem resposta. Um arsenal russo foi instalado em Kalininegrado, enclave russo entre a Polônia e a Lituânia, habitado por 400 mil pessoas.

A OTAN, porém, está a ficar claramente enfraquecida em matéria de opinião pública. E para isso também ajudou, antes e depois desta cimeira, que a OTAN persista com uma narrativa relativa às intervenções no Iraque e no Afeganistão que omitem as tragédias que as populações desses dois países sofreram por elas se terem realizado. E que, uma vez mais, não tenha produzido uma reflexão sobre a falhada previsão de que o fim dos países socialistas do leste europeu iria acabar com as tensões internacionais e promoveria os direitos humanos, a paz e a prosperidade. Hoje é claro para a maioria dos que criaram tais expectativas que, a OTAN à solta, foi uma máquina de guerra que países da Europa, do Médio Oriente e do Norte de África pagaram bem caro.

A OTAN foi criada em 1949, para corresponder militarmente ao Plano Marshall e mais tarde à Comunidade Econômica Europeia (CEE), para ser um instrumento de ameaça aos soviéticos e para os dissuadir de apoiar os comunistas ocidentais, saídos da guerra, especialmente prestigiados pelo seu papel heroico, e por vezes decisivo, na libertação do nazi-fascismo. Tem procurado ser sempre, na prática, o braço armado da União Europeia.

Face à agressividade da OTAN, os países socialistas criaram em 1955 o Pacto de Varsóvia e depois o Comecon, com semelhanças, mas não tão coercivo quanto a CEE. Ambos os pactos militares fizeram sair da esfera da influência da Carta das Nações Unidas as suas forças armadas por aceitarem, em ambos os pactos, colocar as suas tropas, na prática, sob o comando, quer dos EUA quer da URSS.

Em 1998, a OTAN conduziu a sua primeira guerra. E logo contra um país europeu e pequeno, depois do desmembrar sangrento da Jugoslávia, a Sérvia (tive a oportunidade de ter estado em Belgrado sob os bombardeamentos da OTAN). Os EUA criaram a máfia terrorista kosovar e formaram-na na base turca de Incirlik, que agora teve um papel de relevo no golpe na Turquia da semana passada.

Sendo para a generalidade dos povos encarado como natural que a OTAN pudesse ser extinta por ter sido extinto o Pacto de Varsóvia e a “ameaça soviética”, depois do 11 de Setembro de 2001, a OTAN foi reabilitada para combater o terrorismo. Porém, mais uma vez, nesta cimeira de Varsóvia a questão do terrorismo não mereceu mais que retórica (3). A firme coordenação internacional da luta contra o terrorismo, que passou a frequentar a Europa de forma intensa, ficou em “águas de bacalhau”.

Em 2011, a OTAN coordenou a queda do regime líbio e o assassinato selvático de Mouamar El-Kadhafi (como já o fizera com Saddam Hussein). Em 2012, coordenou o lançamento das intervenções contra a Síria, a partir do Comando Aliado de Terra, em Esmirna, também na Turquia. E se a OTAN passou a atuar fora da Europa, logo foram integrados na Aliança outros países dessas bandas: Kuwait, Qatar, Jordânia, Israel e Bahrein.

Nesta cimeira de Varsóvia, os EUA tiveram de ouvir as bocas do presidente francês, que já referi no artigo anterior, e a Inglaterra recusou-se a aumentar a sua participação financeira. Mas isso são peanuts* relativamente ao que se exigiria aos dirigentes europeus para fazer parar a besta. Será desejável que o façam antes dela estar a andar.

Há meses atrás, o Departamento de Estado para a Defesa reclamou a quadruplicação do orçamento destinado a financiar as já atrás referidas medidas de reforço da OTAN (4). A administração dos EUA deseja que os parceiros da OTAN reforcem as suas comparticipações, questão que mantém em análise.

Atualmente, cada membro deve pagar 2% do seu PIB para adquirir armas que respeitem as normas da OTAN…que só se encontram em fornecedores dos EUA!!!… As indústrias nacionais de armamento, entretanto, foram por isso sendo postas de lado. Entretanto, a Rússia já reconstituiu e modernizou a sua indústria de armamento e a China está prestes a atingir os mesmos níveis de qualidade e fabrico. Os EUA e a OTAN estão gradualmente a ficar para trás.

As debilidades dos EUA, que se estendem a diferentes setores, podem, porém, desencadear ações de graves consequências para a Humanidade.

(1) Eric Draitser é o fundador do StopImperialism.org e comentador convidado da CounterPunch Radio. É um analista geopolítico independente, sediado na cidade de Nova Iorque e que pode ser contactado pelo email ericdraitser@gmail.com

​(2) O “antimíssil” pode ter uma leitura perversa, o de ser uma defesa contra mísseis. De fato, significa impedir a resposta com mísseis de um país a mísseis de longo alcance que já estejam no seu trajeto contra si, usando para instalar esses sistemas em países mais próximos do alvo a atingir, a Rússia. A Rússia já fez saber que atingirá o atacante como os países de proximidade que a isso se prestem.

(3) Nesta cimeira de Varsóvia, a OTAN mostrou-se preocupada, sim, com a Coreia do Norte e a instalação pelo Pentágono na Africom. Não tratou da América Latina, reservada nestes areópagos, como coutada privativa dos EUA. 

(4) Le Monde de 17 de Junho de 2016.

* Termo em inglês que neste contexto significa “coisa de pequena monta”, “ninharia”.

Fonte: AbrilAbril

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