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A Usaid, os Panamá Papers e o tal Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos

08/04/2016

O porta-voz do Departamento de Estado dos Estados Unidos, Mark Toner, ao admitir que Washington financiou jornalistas que hackearam computadores de um escritório de advogados e montaram o show denominado Panamá Papers, provocou um grande quiproquó.

Por Luis Manuel Arce Isaac

Toner argumentou que o financiamento através da Agência de Ajuda ao Desenvolvimento (Usaid) a um grupo para que violasse informação empresarial privada no escritório Mossack-Fonseca, não foi para “perseguir certos objetivos ou pessoas”, mas para “investigações jornalísticas independentes”.

O erro de Toner é que ao revelar o financiamento público de uma ação delituosa, admite responsabilidade no fato ilícito de um ente oficial, mesmo que acredite que a Usaid agiu sem conhecimento de causa, algo sumamente difícil de pensar com os péssimos antecedentes dessa instituição que depende do Departamento de Estado.

A Usaid tem uma longa história negativa na América Latina, no Caribe e em outros lugares, com denúncias e processos judiciais muito recentes por ações ilegais, de ingerência e de espionagem que provocaram sua expulsão da Bolívia em maio de 2013, da Rússia, em 2012 e condenações unânimes pelo projeto subversivo do Twitter Cubano, conhecido como ZunZuneo.

Que o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) com sede em Washington, receba dinheiro da Usaid, isto confirma seu pouco crédito ao integrar a estrutura de Think Tanks criados pelos círculos de poder real dos Estados Unidos para suas campanhas ideológicas contra líderes políticos progressistas e de desestabilização social.

A afirmação de seu diretor, Gerard Ryle, de que trata de “demonstrar que o jornalismo pode ser feito de maneira responsável”, é um insulto à inteligência, pois na realidade não fizeram jornalismo nem investigação, mas simplesmente hackearam de maneira mal intencionada porque revelaram seletivamente uma  mínima parte dos 11,5 milhões de papéis usurpados em uma ação criminosa que deveria ser resolvida nos tribunais.

Os papéis do Panamá são uma trapalhada, e no Departamento de Estado, na União Europeia ou na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, onde a ideia parece ter surgido, devem estar passando mal por tê-la concebido.

O fracasso não significa que o capítulo esteja encerrado, pois a confusão agora está por toda a parte e não será tão fácil fazer com que ela acabe, como está ocorrendo na Argentina com a intenção do presidente Maurício Macri de abrir três empresas offshores e ocultá-las. Esta aventura expôs ao ridículo personagens do espetáculo político que não estavam no programa original do show.

O pretenso objetivo principal do “escândalo”, prejudicar a imagem internacional do presidente russo Vladimir Putin depois dos êxitos de sua política na Síria, fracassou totalmente.

Ao contrário, as pessoas receberam evidências de que os paraísos fiscais reais não estão no Panamá, nas ilhas do Caribe nem no Pacífico, mas em terra firme na Europa e nos Estados Unidos. Isto, sim, estimula a análise e a investigação jornalísticas verdadeiras e profissionais.

Há quem especule que os papéis do Panamá são, ademais, um balão de ensaio dos grandes centros de poder capitalistas criadores dos serviços offshores, em busca do controle real de uma gigantesca massa de dinheiro calculada em mais de 30 trilhões, que o sistema financeiro necessita limitar, não tanto porque as grandes potências deixam de receber dezenas de bilhões pela evasão de impostos, mas pelo desequilíbrio que gera nas finanças internacionais.

Há enormes bancos muito comprometidos com essas quantias de dinheiro que não aplicam como fundos nacionais e estão fora da planificação das grandes economias. Nas análises das crises financeiras, como a de 2008, cujas consequências ainda persistem, nenhum governo as menciona na adoção de medidas anticrise como as relacionadas com as taxas de juros, a emissão de moeda ou as políticas tributárias, para mencionar apenas algumas.

A ideia não é inverossímil se levamos em conta que há uma acelerada concentração do capital financeiro mundial em umas 30 famílias muito poderosas que atuam por cima dos Estados nacionais e inclusive de suas entidades, como a OCDE, mesmo quando as dominam, e aspiram a um novo sistema financeiro internacional que consolide esse império.

Quem sabe se os papéis do Panamá (poderiam ter sido de outros países inclusive dos Estados Unidos) são também um exercício para empreendimentos mais complexos como o plano de substituir o dinheiro de papel por uma moeda virtual que funcione como uma câmera de vídeo que permita a esse império vigiar cada segundo a fortuna ou a miséria de qualquer ser humano onde quer que se meta.

Fonte: Prensa Latina; traduzido pela redação de Resistência

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