Opinião

Fidel Castro: Um leitor exemplar

27/01/2017
Fidel lendo em Sierra Maestra / Foto: arquivo

Apenas três meses haviam se passado após o triunfo revolucionário de 1959, quando uma das propostas mais importantes do Comandante-em-Chefe da Revolução foi cumprida: a criação da Imprensa Nacional de Cuba. A estreia editorial, que encabeçava um grupo de textos universais singulares, foi “O Engenhoso fidalgo Dom Quixote” de Miguel de Cervantes y Saavedra. Nem a missão, nem o título foram escolhidos aleatoriamente. Fidel, um leitor exemplar, que conhecia bem o valor agregado à boa leitura, os considerou essenciais para construir o desenvolvimento da cultura educacional necessária ao povo cubano.

Por Madeleine Sautié

Livros e ideais de justiça, nada mais próximo da essência humana de Fidel, cuja inteligência aguçada muito se deveu ao contato permanente com as letras, o que seguramente também forjou seus sentimentos nobres e altruístas, impulsionados desde a juventude até, pode-se dizer, o último suspiro de vida.

Desde que iniciou a leitura, Fidel sabia que Dom Quixote era um texto imprescindível, a obra literária mais completa da literatura espanhola de todos os tempos e uma história onde um homem apaixonado pelo mundo enfrentava, assim com o próprio Fidel, mais tarde – se se entende a metáfora como a sua luta contra o monstro do imperialismo – moinhos de vento gigantescos que precisavam ser eliminados da face da terra para o bem da humanidade.

Muitos seriam os livros que deixariam sua marca neste leitor voraz que desenvolveu o seu espírito a partir da força da leitura. Plutarco, Cirilo Villaverde, José Martí … resumi-los seria difícil; para citar alguns, um exercício para aproximarmo-nos de seu encontro com a literatura, que levava consigo nas mochilas e no melhor de seu pensamento.

Quando esteve preso, após os acontecimentos de Moncada, teve o maior tempo de sua vida para dedicar-se à leitura – a prisão fecunda. Passava entre 12 e 15 horas diárias entre os livros, muitos da política, da história, da obra de Martí … e tornou estes mestres da literatura uma universidade cultural.

Para Fidel foram essenciais a leitura das obras de Fyodor Dostoyevsky, León Tolstoy, Benito Pérez Galdós e Victor Hugo. Suas leituras sobre Honoré de Balzac, durante os dois anos em que esteve preso, foram fascinantes. Supôs que Karl Marx apreciava o estilo do romancista que brilhou no palco do realismo crítico francês e que tal estilo teria influenciado o Manifesto Comunista. “Talvez sem Balzac, o Manifesto não teria tido o mesmo sucesso, nem a ampla difusão alcançada”, declarou uma vez.

Os dez volumes de Juan Cristóbal, Romain Rolland, que considerou uma obra-prima, foram devorados por este leitor incansável que elogiou seu autor como sendo um grande escritor, humanista, pacifista e de um valor literário inestimável.

Teria apreciado muito estar mais de perto de muitos autores. Com Ernest Hemingway pôde conversar em duas ocasiões, admirava seus monólogos e humanitarismo. Mais de uma vez leu seus romances Por Quem os Sinos Dobram; Adeus às Armas e O velho e o mar, com o qual o autor ganhou o Nobel.

Do escritor e filósofo francês Jean-Paul Sartre, recordava sempre a “amistosa” obra, “Furacão sobre o açúcar”, escrita sobre os primeiros anos da Revolução, uma reportagem para o jornal France Soir, de Paris.  Leu também Jean-Edern Hallier, outro contemporâneo francês, a quem considerava um debatedor talentoso.

A necessidade de nutrir o espírito com a seiva da leitura foi um dos propósitos mais prementes da Revolução, por isso, desde o início colocou em andamento uma reforma abrangente da educação, que estendeu os serviços educacionais para toda a população, e para a qual foi preciso, dentre uma longa lista de desafios, a construção e a reforma de escolas e a criação do Escritório de Planejamento Integral da Educação, para alcançar a intenção de libertar o povo cubano da ignorância.

Fidel argumentou que escolas e bibliotecas em cada comunidade não deveriam prescindir de uma seleção de livros que contemplassem as melhores obras literárias da humanidade, capazes de proporcionar uma ideia precisa do mundo em que nascemos e vivemos e, que para isso, era mister colocar em prática, mesmo nos momentos mais árduos, programas e campanhas para aproximar a leitura da população.

Consciente de que a leitura é um escudo contra todos os tipos de manipulação – porque “mobiliza as consciências, desenvolve a mente e fortalece a inteligência” –  Fidel preferiu dizer ao seu povo, “leiam”, ao invés de “acreditem”, uma maneira de direcionar para as páginas dos livros o olhar daqueles que deveriam constatar a verdade, por meio da instrução e da cultura.

Poucos dias depois de converter a ilha na capital mundial da literatura, com a abertura da 26ª Feira Internacional do Livro, Fidel, o leitor, o amante da literatura, permitiu que em sua Pátria, pela primeira vez na história, houvesse a possibilidade de que absolutamente todas as crianças pudessem ler. Como revela sua condição de erudito, condutor da sabedoria, do homem que viveu iluminado pelo amor à humanidade, alimentado, sem dúvida, pela contribuição fundamental da leitura.

Fonte: Granma, tradução de Maria Helena D’ Eugênio para o Resistência

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