Opinião

Ciro quer morrer para a esquerda?

07/01/2019

Por José Reinaldo Carvalho (*)

Com a entrevista ao jornalista Florestan Fernandes Júnior, publicada nesta segunda-feira (7) no El País e manchetada por Brasil247, Ciro Gomes deu novos sinais de que está atravessando o Rubicão, rumo à direita.

Ao fazê-lo, pode estar assinando seu atestado de óbito como pretendente a representar qualquer coisa que seja “de esquerda” ou “centro-esquerda” no país.

É natural que a esquerda se divida em campos, famílias políticas e ideológicas distintas e concorrentes e que cada setor em que se fragmenta busque a afirmação quanto a posições políticas pontuais diante de fatos concretos.

É natural também que os diferentes setores que disputam o campo democrático e popular se apresentam com identidades próprias nas contendas eleitorais e nas ações que empreendem no âmbito de movimentos sindicais, no parlamento e qualquer que seja o cenário da luta política e social.

Porém – “e sempre tem um porém”, para lembrar o irreverente Plínio Marcos – uma coisa é isto, outra coisa é se passar por reformador, combatente pela soberania nacional e a democracia, opositor do governo de extrema-direita, buscar ser a alternativa desse campo, mas de fato agir como um protagonista a serviço da direita. Foi assim que se comportou Ciro Gomes, assim que se posicionou com todas as vociferações que fez durante a entrevista que deu a Florestan Fernandes Júnior.

Ciro não defendeu posições políticas, não polemizou, não exerceu a dialética. Fez confissões, acusações, xingamentos, juras.

Confessou que nunca apoiou Lula e Dilma por convicção, mas premido por circunstâncias. Renegou o que dizia defender. Por isso se mostrou arrependido, do que derivam recalque e ódio. E jurou, beijando alguma cruz e debruçado em algum genuflexório, que nunca, jamais, never, ever, apoiará o PT, esse bando de canalhas e “corruptos”, que não é um partido mas uma “quadrilha”.

Incontinente, fez volteios verborrágicos para justificar por que na prática decidiu facilitar a eleição de Bolsonaro, ao se ausentar da batalha do segundo turno e negar apoio a Haddad.

Não se deteve sequer diante da traição. Negou a Lula a condição de preso político. E tripudiou sobre a ação política deste no exercício – por legítimo direito, mesmo que desde o cárcere – da liderança que lhe cabe, em aliança com demais setores autenticamente de esquerda e do movimento popular, na luta em defesa da democracia, dos direitos do povo e da soberania nacional, vilipendiados pelo governo Bolsonaro.

Depois dos equívocos e da traição, Ciro apresentou uma alternativa falsa, a própria. Pretende ser o pós-PT, o pós-Lula, o enviado, o ungido como candidato de uma frente e bloco parlamentar que só serão expressão da amplitude e da unidade se estiverem sob sua liderança.

Esta estratégia de Ciro vai fracassar. Não há salvação para a esquerda se não estiver unida. Qualquer tentativa de atravessar o Rubicão, significará a opção por ser linha auxiliar da direita e morrer para a esquerda.

(*) Jornalista, editor da Página da Resistência, membro do Comitê Central e da Comissão Política do PCdoB, integrante do projeto Jornalistas pela Democracia

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